Convido a
todos a lerem o meu artigo publicado no blog na PartidA!
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Comissão da Mulher do IAB:
um marco
A mulher com deficiência está construindo uma história de inclusão
no Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB). Sou a única pessoa com
deficiência a integrar seus quadros em 174 anos de existência. E no último
abril tive a honra de ser nomeada presidente da sua Comissão da Mulher.
Senti uma
inenarrável emoção pela confiança em mim depositada, principalmente por
tratar-se de uma comissão que não é exclusiva das pessoas com deficiência
(PCD).
Sempre sonhei
derrubar o cruel gaveteiro, figurativamente construído pela preconceituosa
sociedade. Em cada gaveta encontrava-se um seguimento populacional: pessoas com
deficiência, negros, mulheres, idosos, crianças, refugiados, nordestinos,
humanos em situação de rua, etc. Com a Comissão da Mulher esse móvel veio abaixo.
E que maravilha, essa bagunça humanitária! Desse marco para a frente, veremos
todo mundo junto e misturado.
Na nossa
proposta de fala e escuta, pretendo dar voz a todas as mulheres que, comumente,
são excluídas das rodas de conversas. Assim, nos eventos da Comissão da Mulher
do IAB, obrigatoriamente, deverão haver várias representações de mulheres que,
em tese, ainda estão sem voz.
No dia 30 de
maio, por exemplo, foi realizado o primeiro evento, intitulado “O mercado de
trabalho para a mulher brasileira nos tempos atuais”. Além das mulheres
brancas, privilegiadas, tive a felicidade de contar com três palestras de
mulheres sempre esquecidas pela sociedade.
A advogada Maria
Eduarda Aguiar relatou os percalços enfrentados pela mulher transexual,
enfatizando “a invisibilidade, ocasionada pelo machismo estrutural e cultural,
o abandono familiar, a falta de capacitação ocasionada pela prematura evasão
escolar.” Esclareceu que “5% das mulheres transexuais conseguem um emprego
formal e 90% estão na informalidade e ou prostituição, tendo que brigar pelo
respectivo nome social.”
A presença da
advogada negra Ana Carolina Lima, por sua vez, trouxe a consciência de que “não
é tarefa fácil transformar o olhar social para com a mulher negra, antes vista
como serviçal.” Assim, ter conquistado o título de doutora não foi tarefa
fácil. Aduziu que “há ainda muitos olhares de estranhamento no meio jurídico,
ora por ser mulher e, ainda mulher negra.”
Eu falei sobre a
ausência de oportunidades para a mulher com deficiência. Lembrei que, enquanto
as mulheres sem deficiência estão dando os primeiros passos rumo à igualdade de
gênero, as mulheres com deficiência ainda estão em fase gestacional.
Até agora, o
modelo social das deficiências está na figura do homem branco, adulto, heterossexual
e com lesão medular, focado no contexto americano de 1948. Assim, as mulheres
com deficiência, simbolicamente, têm valor social menor que homens sem e com
deficiência e, também, menor valor que as mulheres sem deficiência. Logo, o
mercado de trabalho para elas está absurdamente fechado.
A ideia de boa
aparência, afinal, imposta pelo capitalismo, repele todo corpo que não caiba na
fôrma da indústria da moda. O ser que habita um corpo diferente está fora! Fora
da vida… Além disso, a educação para essas pessoas é muito precária, ante a
ausência de todo tipo de acessibilidade – o que lhes retira bem mais as chances
de trabalho.
É preciso
reconhecer, ainda, que a lei de cotas – que já existe há 26 anos – não pegou.
Em 2016, mesmo com a vigência da LBI (Lei Brasileira de Inclusão) o TST
pacificou o entendimento de que, por ausência de capacitação das PCD, as
empresas não podem ser punidas por não preencher as cotas. Absurdo! Afinal,
também é da sociedade (empresas cidadãs) a obrigação de capacitação das PCD.
Regentes republicanos, no sentido lato sensu, é o que
nos falta. Com a república, afinal, vêm a responsabilidade e a
responsabilização. A democracia precisa ser temperada com a república! Ah, se
tivéssemos esta consciência, que maravilha viver!
O Poder Judiciário,
no entanto, dá o mau exemplo à sociedade. Prova disso está na imposição de um
PJe (Processo Judicial eletrônico) inacessível, o que baniu as advogadas cegas
da advocacia. A ata de reunião do CNJ de número 40, de 12 de setembro de 2013,
comprova a intenção de EXCLUIR do trabalho esse seguimento quando registra para
a eternidade: “(…) que, como há a possibilidade de capacitar idosos, mas não de
melhorar a visão dos deficientes, devemos atender os demais.” Diante dessa
desumanidade do CNJ, como exigir da sociedade que reconheça a competência das
PCD para o mercado de trabalho?
Apesar desses
problemas, nossa! Como o público se interessou em conhecer essas escondidas
informações! De fato, é o diálogo o melhor caminho para as necessárias
transformações. Aquele nosso primeiro evento ressignificou tantas ultrapassadas
convicções. São com esses pequenos e contínuos exercícios de acessibilidade
atitudinal, que não custam dinheiro, que transformaremos este Brasil tão
desigual. Tiramos os presentes do piloto automático.
Agora, já estou
trabalhando no projeto do próximo evento, intitulado “O preconceito contra as
mulheres positivas e as infecções sexualmente transmissíveis”. Essas mulheres,
insensatamente, são deixadas à margem da sociedade. Grande parte dos seres
humanos sequer as cumprimentam pegando-lhes nas mãos – e, quando o fazem,
correm para lavá-las com medo de contrair HIV, o vírus causador da AIDS. Essas
companheiras, portanto, especialmente nesse momento tão conturbado de suas
vidas, necessitam de muita sororidade! Precisamos ouvir as vozes dessas
mulheres e de tantas mais que não conseguem ser escutadas.
Mediante a breve
exposição acima, fica certo que o diferencial da Comissão da Mulher do IAB será
a inclusão de todas as mulheres normalmente excluídas pelas suas pares e pela
sociedade.
Um coro. Um coro a
capella. Sim. Quanta felicidade será ouvir todas as mulheres, em
simultâneo e de modo coordenado, cantarem a mesma canção. Sem maestrina e sem
hierarquia. Uau! Vozes com diferentes registos ou timbres interpretando a mesma
canção. A canção da partidA! Da vida! Meus olhos cegos veem o letreiro
anunciando: as partidAs apresentam a obra musical Flores da Sororidade!
Delícia.
O amor a si
própria e ao próximo é um exercício diário.
Disponível em:
https://partidanet.wordpress.com/2017/06/20/comissao-da-mulher-do-iab-um-marco/